Sempre me impressiona como pequenos detalhes podem criar laços invisíveis entre nós e a ficção. O nome da protagonista de Normal People, Marianne, é quase idêntico ao meu. Isso, por si só, já me fez sentir um vínculo com ela antes mesmo de conhecê-la de verdade. Mas conforme avançava na leitura, percebi que essa conexão era muito mais profunda: eu me via na maneira como ela existia no mundo, na forma como se sentia deslocada, no desejo inabalável de ser compreendida – e, acima de tudo, amada.
Normal People é um romance que parece, à primeira vista, simples. A história de Marianne e Connell atravessa anos de idas e vindas, encontros e desencontros, e uma complexidade emocional que Sally Rooney traduz com uma precisão dolorosa. Não é um livro sobre eventos extraordinários, mas sobre o peso de sentir demais.
Marianne tem essa crença persistente de que ninguém gosta verdadeiramente dela. Ainda que eu não compartilhe sua experiência de rejeição familiar – e sou grata por isso –, o sentimento de ser, de alguma forma, "incapaz" de ser amada sem reservas é algo que me atingiu de frente. Marianne sente que ocupa um lugar estranho entre as pessoas, que há uma barreira invisível entre ela e os outros. E eu conheço essa barreira intimamente.
A Analogia com o Autismo de Grau 1
Ler Normal People me fez refletir sobre minha própria experiência com o autismo de grau 1. Marianne não é diagnosticada no livro, mas muito do que ela sente ressoa profundamente com essa vivência. A dificuldade em interpretar certas dinâmicas sociais, a sensação constante de estar "errada" ou "deslocada", a luta interna entre desejar proximidade e não saber como mantê-la – tudo isso ecoa na forma como muitas pessoas autistas experimentam o mundo.
Marianne é intensamente introspectiva, e essa interioridade, às vezes, a faz parecer fria ou distante. Mas, na verdade, ela sente tudo com uma profundidade esmagadora. Muitas vezes, parece que há uma diferença entre como ela se percebe e como os outros a enxergam. E essa discrepância é algo que conheço bem: a sensação de ser mal interpretada, de ter intenções que não chegam intactas ao outro lado da conversa, de tentar ser aberta e, ainda assim, ser lida como alguém difícil de alcançar.
O que mais me tocou foi essa convicção silenciosa dela de que, no fundo, ela é indesejável. Não importa se Connell a ama ou se outras pessoas a admiram – Marianne tem essa crença enraizada de que há algo nela que torna o amor dos outros instável, condicional. Para alguém com autismo de grau 1, que cresce sentindo que reage de maneira diferente ao mundo, que percebe nuances que outros ignoram mas perde sinais sociais que parecem óbvios para a maioria, essa insegurança é familiar. Como se a conexão humana fosse uma equação que todos resolvem naturalmente, menos a gente.
A Beleza de Ser Compreendido
Mas o que torna Normal People um livro tão brilhante não é apenas essa dor crua, mas também a forma como ele reconhece que o entendimento entre duas pessoas pode ser um refúgio. Marianne e Connell não têm um relacionamento perfeito – na verdade, passam boa parte da vida se machucando sem querer –, mas há algo na conexão deles que transcende a comunicação superficial. Eles se compreendem de uma maneira que quase ninguém mais consegue.
E isso me dá esperança. Porque, no final, talvez não precisemos que todo mundo nos entenda. Talvez baste encontrar aqueles poucos que veem quem realmente somos – e ficam.
A Relação Entre Marianne e Connell
Se há algo que faz Normal People ser tão marcante é a maneira como Sally Rooney constrói a relação entre Marianne e Connell. Não é uma história de amor convencional, cheia de declarações grandiosas ou gestos cinematográficos. Pelo contrário, é um retrato cru e honesto de duas pessoas que se amam profundamente, mas que nem sempre sabem como lidar com esse amor. E talvez seja justamente essa imperfeição que torna tudo tão real.
Marianne e Connell são diferentes em muitos aspectos: ela, vinda de uma família rica, mas emocionalmente fria; ele, criado em um ambiente mais humilde, mas cercado de carinho. Enquanto Marianne se sente intrinsecamente indesejável, Connell carrega inseguranças que vêm da sua origem social e da pressão de ser "normal". E ainda assim, há algo entre eles que vai além dessas diferenças.
O que mais me encanta na relação dos dois é a forma como eles conseguem, mesmo entre erros e mal-entendidos, enxergar um ao outro de um jeito que ninguém mais consegue. É um amor que não precisa ser explicado, porque se manifesta nos detalhes: na forma como Marianne entende os silêncios de Connell, na maneira como ele a defende quando ninguém mais o faz, nos pequenos gestos de cuidado que atravessam os anos.
E o mais bonito: eles não precisam ser a versão "ideal" um do outro para que o amor entre eles seja verdadeiro. Marianne não precisa ser consertada, e Connell não precisa ser o herói perfeito. Eles se amam não apesar das suas falhas, mas com elas.
No fim, o que Normal People mostra é que, às vezes, as conexões mais importantes da nossa vida não são sobre finais felizes no sentido tradicional, mas sobre encontrar alguém que te veja por inteiro – e escolher enxergar essa pessoa também.
eu acho que li esse livro errado porque eu tinha uma percepção completamente diferente! me fez querer assistir a serie e ler o livro novamente (eu era mais nova tambem)
Normal people é o meu livro favorito da vida, reli pelos menos umas 3 vezes, e eu amo como toda vez que releio tenho uma perspectiva diferente da história. Eu amei ler a sua perspectiva também, ta incrível!!